Dei-me conta
de que há um ano e alguns meses não banho no rio da minha terra. Hoje certa melancolia interna e o calor forte
da tarde me fez pensar nele. Tenho o rio como um amigo ambiental. Consigo
sentir sua vida líquida. Obviamente, sempre o encontro no mesmo lugar
geográfico, mas sempre sofre algumas alterações: montões de areia, devido o
subir das enchentes, mudaram de posição; uma árvore cresceu mais um pouco nas
suas margens. Ações naturais e antropicas mudam sempre o rio. Assim, sempre existe algo novo para ver.
Fui então ao
encontro do Parnaíba. Pilotei a moto até a casa de meu pai que mora perto. Após
alguma fala com o genitor, peguei na escrivaninha de seu quarto uma revista
Seleções de junho e continuei rumo ao Parnaíba caminhando. Ao chegar, desço o
barranco feito de pisara, sento a margem, tiro a sandália e ponho os pés dentro
da água transparente, correndo pra longe. Vai para o atlântico, penso. Defronte
a mim o estado do Piauí; uma praia de areia branca clareada pelos últimos raios
do sol. Do lado da margem esquerda que estou, onde estão nossos supremos
domínios estaduais, vejo dentro de uma canoa um amigo. Esses amigos alguns
meses atrás sofreu uma AVC e agora estava ali, com sua esposa pescando. Sinto
uma alegria me envolver, em saber que ele a cada dia melhora.
Enquanto meus
pés ficam de molho nas águas límpidas do Parnaíba, folheio os textos da
Seleção, cuja capa amarela sobre a Copa de Futebol, sediada no país, tem
causado frenesi. Internamente os textos da revista falam do jeito “incrível de
dizer eu te amo”; sobre cuidar da diabetes; animais que expressam amor aos
parceiros; sobre lixo deixado por alpinistas no topo do Everest; da vida rural
na Transilvânia, onde húngaros, romenos e alemães vivem de maneira simples,
ruralista e bucólica. Li com gosto tal reportagem chamada de “Um mundo fora do
Tempo”, cujas belas fotografias da antiga vida rural e de seus habitantes,
nesta parte do mundo, me encantaram. Algo belo também que me encantou, foi a
crônica da escritora Lisa Fields, chamada “Lembranças”,
sobre a concha de retalhos que ela costurou com pedaços das primeiras roupinhas que sua filha Eva usou até os cinco anos. A concha seria um
memorial, uma homenagem a sua filhinha amada. Cada parte da peça eram partes da
história da menina, momentos vestuário da sua vida: partes do vestido do
nascimento, a roupa do batismo, do primeiro ano, do primeiro dia pra escola, etc.
Um encantador o texto.
Há esta
altura, menos triste, e mais reflexivo pensei Nele, em Deus, diante da beleza
da criação que é o Parnaíba. Pensei nos últimos intensos 25 dias de viagens
entre os estados do Tocantins e Maranhão. Olhos para os meus pés dentro do Parnaíba,
cheio de rachaduras, enfim, estão descansando. Ali pensei no amor também, os
tantos temas de amor da revista, creio me levaram a pensar neste sentimento.
Então penso num amigo que muito amei que já partiu há dez anos inesperadamente,
no qual uma foto dele vista poucos minutos no computador, antes de decidir vim
ver o rio, aumentaram a tristeza que existia em mim. E bom amar, digo, quando
assim fazemos tudo tem mais sentido. Assim penso com ternura em uma amizade que
brotou alguns meses e cresce em mim. É bonito crescer afeto, amizade dentro da
gente. Olho pra o rio e me lembro de uma
frase: “correr atrás d’aquilo que você ama”. O amor é sim, penso, tudo na
existência.
Enquanto o sol
vai embora e medido as margens do velho monge, alguns “mucuins” atacam o meu
braço desnudo. Quanto mais finda à tarde, mais mucuins querem sangue. Passo
pedra sabão nos pés rachados. Em molhos na água é mais fácil nivelar a pele do
pé. Por que os pés da gente racham? O bermudão que visto devido à higiene se
molha todo. Fico em pé. Não existe mais luz do sol na areia da praia. Porém,
aumenta os pescadores dentro rio, subindo com suas redes. Chega um conterrâneo
idoso. Saúda-me. Tira o calção, banha de
cueca no rio. Chega outro ribeirinho, entra numa canoa ancorada e rema para a
outra margem.
Desejo banhar
para me livrar dos mucuins, e por que também queria sentir o rio. Enquanto
nenhum olhar humano me ver, fico nu, despido totalmente. Assim, rápido, me
atiro num salto magistral no Parnaíba. Suas águas refrescantes, com corredeiras
medianas, fazem com quer eu me encontre com partes do meu ser, minha história
natal e ambiental, onde sem dúvida, o rio é um dos elementos mais
significativos. Nado nu. Mergulho nu, pelado, naturismo vivencial salutar, e
todo o meu corpo e alma são limpos, purificados, existindo uma sincronia de
ternura com o meu rio.
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