segunda-feira, 7 de julho de 2014

Leituras, reflexões do dia e banho nu no Parnaíba


Dei-me conta de que há um ano e alguns meses não banho no rio da minha terra.  Hoje certa melancolia interna e o calor forte da tarde me fez pensar nele. Tenho o rio como um amigo ambiental. Consigo sentir sua vida líquida. Obviamente, sempre o encontro no mesmo lugar geográfico, mas sempre sofre algumas alterações: montões de areia, devido o subir das enchentes, mudaram de posição; uma árvore cresceu mais um pouco nas suas margens. Ações naturais e antropicas mudam sempre o rio.  Assim, sempre existe algo novo para ver.
Fui então ao encontro do Parnaíba. Pilotei a moto até a casa de meu pai que mora perto. Após alguma fala com o genitor, peguei na escrivaninha de seu quarto uma revista Seleções de junho e continuei rumo ao Parnaíba caminhando. Ao chegar, desço o barranco feito de pisara, sento a margem, tiro a sandália e ponho os pés dentro da água transparente, correndo pra longe. Vai para o atlântico, penso. Defronte a mim o estado do Piauí; uma praia de areia branca clareada pelos últimos raios do sol. Do lado da margem esquerda que estou, onde estão nossos supremos domínios estaduais, vejo dentro de uma canoa um amigo. Esses amigos alguns meses atrás sofreu uma AVC e agora estava ali, com sua esposa pescando. Sinto uma alegria me envolver, em saber que ele a cada dia melhora.

Enquanto meus pés ficam de molho nas águas límpidas do Parnaíba, folheio os textos da Seleção, cuja capa amarela sobre a Copa de Futebol, sediada no país, tem causado frenesi. Internamente os textos da revista falam do jeito “incrível de dizer eu te amo”; sobre cuidar da diabetes; animais que expressam amor aos parceiros; sobre lixo deixado por alpinistas no topo do Everest; da vida rural na Transilvânia, onde húngaros, romenos e alemães vivem de maneira simples, ruralista e bucólica. Li com gosto tal reportagem chamada de “Um mundo fora do Tempo”, cujas belas fotografias da antiga vida rural e de seus habitantes, nesta parte do mundo, me encantaram. Algo belo também que me encantou, foi a crônica da escritora Lisa Fields, chamada “Lembranças”, sobre a concha de retalhos que ela costurou com pedaços das primeiras  roupinhas que sua filha Eva usou até os cinco anos. A concha seria um memorial, uma homenagem a sua filhinha amada. Cada parte da peça eram partes da história da menina, momentos vestuário da sua vida: partes do vestido do nascimento, a roupa do batismo, do primeiro ano, do primeiro dia pra escola, etc. Um encantador o texto.
Há esta altura, menos triste, e mais reflexivo pensei Nele, em Deus, diante da beleza da criação que é o Parnaíba. Pensei nos últimos intensos 25 dias de viagens entre os estados do Tocantins e Maranhão. Olhos para os meus pés dentro do Parnaíba, cheio de rachaduras, enfim, estão descansando. Ali pensei no amor também, os tantos temas de amor da revista, creio me levaram a pensar neste sentimento. Então penso num amigo que muito amei que já partiu há dez anos inesperadamente, no qual uma foto dele vista poucos minutos no computador, antes de decidir vim ver o rio, aumentaram a tristeza que existia em mim. E bom amar, digo, quando assim fazemos tudo tem mais sentido. Assim penso com ternura em uma amizade que brotou alguns meses e cresce em mim. É bonito crescer afeto, amizade dentro da gente.  Olho pra o rio e me lembro de uma frase: “correr atrás d’aquilo que você ama”. O amor é sim, penso, tudo na existência.
Enquanto o sol vai embora e medido as margens do velho monge, alguns “mucuins” atacam o meu braço desnudo. Quanto mais finda à tarde, mais mucuins querem sangue. Passo pedra sabão nos pés rachados. Em molhos na água é mais fácil nivelar a pele do pé. Por que os pés da gente racham? O bermudão que visto devido à higiene se molha todo. Fico em pé. Não existe mais luz do sol na areia da praia. Porém, aumenta os pescadores dentro rio, subindo com suas redes. Chega um conterrâneo idoso. Saúda-me.  Tira o calção, banha de cueca no rio. Chega outro ribeirinho, entra numa canoa ancorada e rema para a outra margem.
Desejo banhar para me livrar dos mucuins, e por que também queria sentir o rio. Enquanto nenhum olhar humano me ver, fico nu, despido totalmente. Assim, rápido, me atiro num salto magistral no Parnaíba. Suas águas refrescantes, com corredeiras medianas, fazem com quer eu me encontre com partes do meu ser, minha história natal e ambiental, onde sem dúvida, o rio é um dos elementos mais significativos. Nado nu. Mergulho nu, pelado, naturismo vivencial salutar, e todo o meu corpo e alma são limpos, purificados, existindo uma sincronia de ternura com o meu rio.

No final, ao subir o barranco de pisara de volta para casa, retorna a ser pessoa alegre e feliz da maioria dos instantes existenciais. Estando com o rio  me reencontro com minha maior essência.



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