(Domingo Libane - *1936 + 2020) |
No dia que a tosse braba, com a falta de ar aumentou
em mim, fazendo - me ir às presas ao Hospital para conversar com um médico,
encontrei aos cuidados da neta Mariana, dona Salvelina, esposa de Seu
Domingo Libane, em uma sala próxima da enfermaria, tomando soro, nada bem. Em conversa com Mariana sobre os sintomas
contou que se suspeitavam que a avó estivesse com COVID -19, mas ainda faria o
teste. O medo de todos era, segundo ela, outras doenças da avó, como a diabete.
Depois deste dia, no isolamento social que foi
necessário me submeter, mesmo com o teste que fiz quadro dias após, ter reagido
negativo ao coronavírus, não ouvi falar mais de dona Salvelina, nem de melhoras ou pioras
de seu quadro clínico. Alguns conhecidos que soube estarem infectados,
mantiveram via redes sociais, esperançosas
conversas comigo de como estavam vencendo o vírus em suas casas, dando-me dicas
para combater o vírus da forte gripe em mim, que me fez escarrar sangue por dois dias. As conversas com eles me eram confortantes, pois nós estávamos confinados, longe das pessoas. Em mim, como
dera negativo o COVID, ainda me dava alguma liberdade de sair um pouco até a
pracinha defronte de casa, ficando certo tempo por lá, tirando prosas com conhecidos, porém com metros de distâncias. Fazia assim, no medo do meu
teste ter sido equivocado, logo poderia contaminar outrens, e, eles, com medo de mim, em justa razão, mantinham distanciamento.
Francamente, essa crise de pandemia desse novo corona
vírus, possui dimensões de guerra. Confinamento nos remete aos filmes e livros lidos de conflitos armados, onde a presença da morte é
constantemente esperada. Nessa pandemia o receio/medo da morte não é através de
bombas ou armas letais congênitas. A morte vem nas partículas do ar, no tocar
objetos ou pessoas, até mesmo se aproximar bem junto delas. E isso assombra a gente de um jeito não experimentado, até então.
Nisto, após
dias confinado, na sexta, boca da noite,
senti grande alívio na melhora da garganta. Estando seca, sem secreção alguma, devido as medicações, principalmente, o mastruz que havia passado beber dois dias antes, como suco. Então, na hora do banho, na
lavanderia, alegre, me sentindo melhor, pus-me a cantar. Começei o repertório, testando a garganta, com a ópera “O Sole Mio”. Depois
cantei “Yesderday”, dos Beatles e minha
predileta francesa “Je ne regrette Rien”, de
Édith Piaf. Umas das três músicas que em momento de entusiasmo gosto de cantar e ouvir. Cantava alto.
Os meus vizinhos poderiam imaginar minha
alegria, quando estão cantei bem mais alto “O que é o que é”, de Gonzaguinha, pois para mim a
vida voltava ser bonita, no superar algo de sofrimento.
Cantei mais outras musicas populares e
evangélicas brasileiras, voltando depois para o computador e a internet, buscando através das fontes os boletins
epidemiológicos das cidades da região para averiguar o avanço ou retrocesso do coronavírus.
Foi então que
umas das minhas fontes me informou que
seu Domingo Libane havia acabado de falecer vítima do COVID 19. A supressa e a tristeza sobrevieram.
Nada sabia sobre o contagio de Seu Domino Libane pelo vírus,
nem que um dos quatro internados em hospitais era ele. Alguém por
demais conhecido por diversas gerações. Logo, o impacto da notícia de sua morte seria maior na comunidade.
Então, fiquamos sabendo através das fontes, que sua mulher, dona Salvelina, 78 anos, havia piorado em seu estado de saúde,
sendo hospitalizada em Caxias, na UTI. E ele, seu Domingo Libane, desde que passou usar máscara e viver a
quarentena, psicologicamente, começo a declinar. Entrou em depressão com tantas
notícias de morte, agravado mais seu
psicológico com a situação da mulher. Doente de alma, prostrou-se
de vez. Não mais comia, nem as pílulas medicinais engolia. Levado ao hospital
local, no agravamento do quadro clínico, também foi pra Caxias. O teste rápido seu,
cujo sangue foi retirado de um dos pés,
devido as veias terem desaparecido do corpo sem forças, acusaram positivo para o
coronavírus.
Seu Domingo Libane, aos 84 anos, só ficou um dia em
Caxias. Morreu rápido. Silenciosamente.
Dona Silverina, ao ir ser internada na segunda vez no hospital, pegou em suas mãos,
pedindo para ele se cuidar. A mesma não sabia que seria seu último pedido ao
companheiro de anos. Era a despedida final.
Ainda na madrugada de sábado seu corpo chegou ao centenário
Boqueirão, onde ele nasceu e viveu sempre,
em alma e presença física, sendo sepultado no cemitério antigo do lugarejo. Não houvera velório, pouquíssimas pessoas se despediram do velho pai dos Libane. Dos 13 filhos apenas a amiga Lina, vinda poucos dias do Rio de Janeiro, se fez presente.
No sábado, sabendo disso tudo, a tristeza me abateu.
Assim como em todos os conhecidos. Entramos em luto juntos com os familiares espelhados no país. Vivemos um luto, em graus, com medo, confinamento e pavor desse inimigo viral nos cercando. Estranho luto.
Foi um sábado, dia dos namorados, de tristeza, no qual a garganta e as minhas emoções não tiveram condições
alguma de voltar a cantar.
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