segunda-feira, 3 de setembro de 2012

TEXTO SOBRE A APA DOS MORROS GARAPENSES NA IMPRENSA DO PIAUÍ

Alex Motta, morador de Buriti de Inácia Vaz, que não é bordador, numa manhã de 2011, bordou comentários a respeito da criação da Área de Proteção Ambiental Morros Garapenses: “O governo do estado do Maranhão cria a APA Morros Garapenses que protege os terrenos menos elevados, mas, por outro lado, entrega as Chapadas de Buriti para os gaúchos”.
A APA Morros Garapenses foi criada em 2008 pelo então governador Jackson Lago como forma de conservar as faixas de transição entre Cerrado e a mata dos cocais no Leste maranhense. A sua área de abrangência abarca 234 mil hectares dos municípios de Buriti, Duque Bacelar e Coelho Neto. O processo de consolidação dessa unidade de conservação fornece uma informação relevante: ela é a única unidade de conservação estadual criada a partir de uma mobilização da comunidade local. Pelo visto, tomando por base a declaração do Alex Motta, essa mobilização não se deu de maneira uniforme nos três municípios e nas comunidades desses municípios do Baixo Parnaiba maranhense.
Nenhuma das considerações descerradas pelo governo do Maranhão no decreto de 31 de dezembro 2008 acena para a agricultura familiar e para o extrativismo. Uma consideração explicita o item educação ambiental e turismo ecológico, aventura e cientifico. Outra discorre sobre o reflorestamento com espécies frutíferas. Sinceramente, no que consta, as populações tradicionais do Baixo Parnaiba maranhense desapareceram para a secretaria de meio ambiente do Maranhão.
Citar-se-ia a agricultura familiar e o extrativismo de frutas do Cerrado por comporem a biodiversidade e por guarnecerem essa biodiversidade. Nomeia-se esse intrincar de agrobiodiversidade. Até onde se sabe, o português do agronegócio é ralo. Os anos de soja, eucalipto e cana não adicionaram palavra original no cotidiano brasileiro. A riqueza do agronegócio foi devolvida à população do Baixo Parnaiba maranhense na forma de empobrecimento do linguajar, do conhecimento tradicional, da economia local e do meio ambiente.
Alguns defendem um pacto de não-agressão entre o agronegócio e segmentos da agricultura familiar para que o desenvolvimento socioeconômico se dissemine. Que o desenvolvimento não fique atrelado a um só setor, é o que dizem. Em certa medida, os órgãos ambientais aderiram a essa idéia faz tempo. A criação de unidades de conservação no Brasil obedece a cartilha do agronegócio, ou seja, onde o agronegócio avança se detém processos de criação de parques e resex. Com respeito a APA Morros Garapenses, os próprios funcionários da SEMA admitem que a categoria APA é permissiva ainda mais em uma região onde se acentuam os interesses do grupo João Santos, plantador de cana e bambu, e dos sojicultores. Um pacto de não agressão interessa mais ao agronegócio do que a agricultura familiar. O Baixo Parnaiba maranhense experimenta e experimentou versões dessa proposta tanto no caso da soja como no caso do eucalipto. Os sojicultores fornecem sementes de feijão para comunidades próximas aos plantios de soja e a Suzano Papel e Celulose disponibiliza maquinário para comunidades próximas aos seus plantios de eucalipto.
O Estado brasileiro é condescendente com o agronegócio e descarta completamente a agricultura familiar e o extrativismo. Bem que os governos poderiam criar uma politica de descarte de agricultores familiares e extrativistas na zona urbana das cidades assim como existe uma politica de descarte de embalagens de agrotóxicos.
Descartar tudo tem sido uma prática do Estado brasileiro. As licenças de desmatamento e as outorgas autorizadas pela SEMA obscurecem a questão dos recursos hídricos no Baixo Parnaiba maranhense. As considerações para a criação da APA Morros Garapenses se desencontram dessa questão tão séria numa região sujeita a desertificação como se presencia em áreas mexidas para os plantios de soja nas bacias dos rios Buriti e Preto. Conhecedora da situação por que passa o Baixo Parnaiba a SEMA deveria restringir ao máximo o uso de determinadas áreas para os plantios de soja e eucalipto. Vê-se o contrário. Desde a criação da APA os desmatamentos em Buriti nunca cessaram sem respeitar espécies protegidas por lei como o pequizeiro e espécies importantes para o extrativismo como o bacuri.
Na região da APA Morros Garapenses, o Fórum Carajás articulado com a Associação dos Amigos de Buriti e com a comunidade de Carrancas carregou e carrega uma variedade de projetos e de atividades com a intenção de resguardar o que sobrou de áreas de Chapada nas nascentes do rio Preto, afluente do rio Munim. Uma das atividades, que contou com o financiamento do Casa(Centro de Apoio Socioambiental), é o manejo das florestas de bacuri na propriedade do Vicente, o gigante gentil do povoado Carrancas. Ele é um sujeito bem alto que, em determinado momento, viu-se pressionado a vender sua posse para um plantador de soja. Decidiu não vender. Como não vendeu, o sojicultor se retirou anunciando que Vicente sofreria com o despejo de agrotóxicos. Provavelmente, caso Vicente vendesse, ele se arrependeria mais tarde. Outros indivíduos se arrependeram. Comunidades inteiras se arrependeram amargamente, pois venderam suas áreas de Chapada por um dinheiro que durou pouco. Um dinheiro que mal deu para comprar uma moto para cada individuo.
O Vicente e o seu Onésio, da comunidade de Carrancas, e as comunidades de Brejinho e de Belém chegaram longe sem recuarem um milímetro sequer.
Fonte: * Mayron Régis, Articulista do EcoDebate, é Jornalista e Assessor do Fórum Carajás e atua no Programa Territórios Livres do Baixo Parnaíba (Fórum Carajás, SMDH, CCN e FDBPM).Postado no Blog Piauí Sempre Verde.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

UM TESTEMUNHO EM DEFESA DE NOSSA NATUREZA *

                                                                         Quando chegamos a  Duque Bacelar,
                                                                                   os  Morros nos recebem com palmas pelo ar ”**  
  
               
                                                                        Quando criança, nas filas cívicas da Escola Paulo Ramos, ao cantar nosso hino municipal, os versos que falam dos Morros, sempre me tocaram. Em pé, em forma na fila, imaginava a beleza das palmeiras batendo palmas ao receber um visitante ou o filho da terra que voltava. No mesmo período, nesses saudosos tempos infantis, fora dos muros do Pulo Ramos, vivia nas trilha dos morros à procura de chichas, jataís, tucuns, jatobás, mutas e de todos os demais frutinhos silvestres que se encontravam. Meus amigos e eu caçamos passarinhos, e em toda temporada de caça da meninice, consegui matar somente um,  o que me fez no correr do tempo pensar dolorosamente em meu maldoso ato. Os passeios mais longos  nos levavam às margens das lagoas e igarapés, onde podíamos ver e ouvir o canto dos socós, das garças, jaças-anãs, juritis,  nambus e demais aves que formam nossa fauna alada. Conheci por nome, as vezes vendo bem perto os animais maiores, os peixes, e aprendi nadar nas águas do igarapé e do açude. Cresci como menino de interior em constante contato com o Meio Ambiente.       
                Ao sair do Paulo Ramos, alfabetizado e apaixonado por livros, devorava todos os que falavam dos animais, pássaros e plantas. Já começando pensar no mundo e na realidade, vi que a em todo o planeta a natureza era covardemente destruída. E em Duque não era diferente. Sendo prático, organizei logo um revistinha e um grupo: “Amigos da Natureza”. O ano era 1992. O Brasil sediava no Rio de Janeiro o famoso Encontro Mundial Eco 92. Entendi tudo pela televisão. Então adolescente, desejava ser biólogo. Neste período minhas caminhadas e explorações pelos morros, rios, lagoas e igarapés, agora eram totalmente solitárias e científicas. Passava horas dentro do mato coletando folhas, frutos e mudas de plantas para estudar e cultivar. Coletava búzios, conchas e pedras ornamentais encontradas, fazendo um levantamento dos animais viventes em nossos ecossistemas. Passei também a repugnar os carros de madeira e o Grupo João Santos.
                  Um dia eu tive que deixar todas essas vivências e ir embora da minha terra para estudar na capital. E longe, com a dor da saudade latejando no peito, escrevi para minha mãe: “Sinto falta de caminhar descalço pelos morros; sinto falta dos banhos no rio; sinto falta de ar puro”. Não resistindo mais a saudade, voltei. Aconteceu, após minha volta, algo extraordinário comigo: a explosão da poesia em minha alma. ECLODIA  um poeta, nascendo em harmonia e irmandade com todo o meio ambiente. Assim, passei  amar, admirar e sentir a natureza de maneira mais intensa. Agora, o barulho do vento nos galhos das árvores; o nascer do sol às margens do rio Parnaíba; o formato bonito e verde dos morros e o cantar dos passarinhos tinham um sentir e gostosura demasiadamente especial. Passava horas e horas “ namorando ” com os olhos toda a beleza existente e vista de cima dos morros, no contemplar de cada detalhe. O famoso poema “O Sentido da Vida ”, é gerado deste relacionamento.                                                             
                     A partir dessa experiência, uma revelação pessoal de 1995, que comecei a sonhar pela “ reserva e proteção total dos morros garapenses ”. O espaço verde da comunidade protegido, respeitado e guardado pelo homem. Um lugar em que as pessoas da cidade, principalmente as crianças, pudessem se envolver com o ambiente natural de maneira amigável e harmoniosa, com respeito, como Deus, o Criador de toda vida, espera de nós.
                       Os morros, o rio Parnaíba, as lagoas, o açude e o igarapé são bens de todos, não podendo ser mais usados de forma destruidora e egoísta. Não devem ser mais devastados, poluídos e queimados barbaramente. Destruir por queimadas os morros é tornar em cinzas partes da minha história; acabando com as boas lembranças de criança da minha geração e de outras que poderão se formar nos contatos com essa natureza, amando esta terra e esta paisagem. É renegar a todos nós um meio ambiente saudável, preservado. Portanto, essas queimadas definitivamente devem findar nos morros. Existem muitos lugares para se fazer esta atrasada cultura de roça de toco e fogo.
                          Assim, todos devem sonhar e buscar a reserva para bem de nossas vidas. O mundo está buscando viver sustentabilidade e a ecologia preservada. E nós fazemos parte do mundo. Somos inteligentes, racionais, pessoas de bem. Se não fizermos isso  tornarem0-nos desumanos, inimigos das obras do Criador e dos seres viventes que dependem de nós. Se não preservamos nossa natureza, dentre as muitas conseqüências negativas, culturalmente, em breve, teremos que riscar os versos do hino da cidade, pois ao chegarmos a Duque Bacelar, os Morros não mais nos encontrão com palmas pelo ar; nem as palmeiras jogarão no chão os coquinhos para as mulheres quebrar, e o poeta que filosofa em cima do monte no “ O Sentido da Vida”, não encontrará mais vida ao derredor dele, pois toda vida existente foi devastada e morta pelo fogo e o interesse egoísta de homens sem amor e respeito a nossa natureza.

                                                                                          Francisco Carlos  Machado